sábado, 25 de fevereiro de 2012

Pescarias estranhas - locas -...

Assistindo  um programa da National Geographic sobre tipos de pescarias estranhas - locas em espanhol -, me deparei com uma prática que remonta ao primitivismo da pesca: a pesca com os pés e com as mãos.
Sem ter, ainda, os apetrechos apropriados para prender, fisgar ou matar os peixes que precisavam para ampliar o leque de alimentação, os nossos antepassados se valeram dos próprios recursos físicos para executar essa tarefa. Cabe lembrar que a observação de animais e pássaros pescadores influiu na escolha dos métodos de captura e no tipo de alimentação. Mais um pouco de observação e viram que quando havia a migração para a desova - piracema - tornava os peixes um alvo fácil para a captura. Quando não estava na época da desova, um pouco de imaginação e intuição fizeram com que começassem a procurar os peixes em tocas traçando um paralelo com suas próprias vidas. Para isso usaram primeiramente os pés e as mãos, depois suas lanças. Essa é a pesca "estranha" mostrada pelo canal de televisão.
Para mim não é novidade já que participei várias vezes deste tipo de pesca. Aproveitávamos as tardes quentes de verão quando íamos tomar banho de rio, para procurar as tocas dos jundiás. Podia ser furnas pequenas composta de pedras superpostas, tocas nas barrancas ou embaixo de troncos. Identificado com os pés, com eles barrávamos a fuga e em seguida, íamos com as mãos e cautela fazer a captura. Procurávamos sempre a cabeça e enfiávamos o polegar em suas bocas sem dente. Era só fechar a pinça com os outros dedos e pronto:  era só sacá-los e atirá-los na barranca.
Outra pescaria mais fácil ainda é na piracema. Em alguns casos pega-se com as mãos em outros com porretes e facões. Os peixes num comportamento de cardume,  enfileiram-se para cumprir o ritual da vida e subir por filetes d'água até um lugar que achem apropriado à desova. É um crime pela facilidade e quantidade que pode ser abatida. Das duas vezes que participei, tirei ensinamentos que me fizeram nunca mais participar.
A primeira não foi tão traumática, visto que em propriedade privada entre dois locais que o proprietário havia povoado com peixes nativos capturados vivos de outros açudes ainda dentro da fazenda. Como se sentia "dono" dos peixes, havia parcimônia na captura: somente alguns exemplares para uma boa refeição e nada mais. Passei alguns dias acampado na fazenda, pescando de maneira tradicional com caniço de bambu. Quando pescava uma ou duas traíras, parava. Com a chegada de uma chuva forte, o dono da fazenda me brindou com uma pescaria no campo! Literalmente. Armamos redes no campo em um banhado sem água até aquele momento!  Com a chuvarada na noite, o riacho lindeiro do banhado transbordou e como desaguava no rio Jacuí os cardumes de peixes sobem para desovar justamente nestes microambientes. A gama de peixes foi grande a quantidade nem tanto. Até um exemplar de dourado apareceu. Fizemos um banquete, já que estava prometida uma outra pescaria "diferente" para que levasse alguns exemplares para casa!
O Fazendeiro possuía três açudes onde armazenava água para as lavouras de arroz. Como tinham desníveis diferentes, um abastecia o outro. O mais alto de todos recebia sua água de um banhado no topo de uma coxilha. Nesse fio d'água é que fizemos a colheita. As traíras subiam pelo filete expondo-se a nós, predadores. Tirávamos com as mãos atirando-as no campo. Mesmo com o comprometimento de pegar apenas alguns exemplares, quando eviscerei bateu o remorso ao ver a quantidade de ovas que não eclodiriam...
O outro episódio merece uma postagem só para ela. Aguardem "Jundiás pastando no Campo"!